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terça-feira, 17 de dezembro de 2013

Horto de nós

Eu teria derramado aquele suco de graviola, pra bebê-lo em você. Pra que a pele grudasse toda e o meu cabelo embaraçasse com o teu. Que nem óleo de coco nos salvasse. Que nem água gelada ou quizumba de ex. Que enfim, nada desse jeito em nós. Um nós.

Guardo nossas páginas onde derramam-se loucuras de níveis imensuráveis pra, quem sabe, publicar depois. Erotismo salgado de mar. Poesia ardida, de tão quente. De tão dentro.

Quando chegar, abrace-me antes que eu corra. Antes que eu use teus treze centímetros além como desculpa pra não alcançar-te os olhos. Violenta-me num beijo, antes que eu possa dizer quaisquer das bobagens que não se diz.

Quatro da manhã e três mil quilômetros depois...

Tarde demais para os meus planos de solidão.

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PS: Treze centímetros além de mim. Três mil quilômetros que sobram. Três dias que faltam.
E tanto (s) nós.

quarta-feira, 13 de novembro de 2013

Diálogos Impossíveis

- Você ainda vai ser minha.
- E nesse dia, você será meu?
(...)
- E se eu te pedir em casamento?
- Você já pediu.
- Mas agora é sério.
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- O que você vai fazer hoje, além de um filho comigo?
- Produção independente?
- Dois. Gêmeos. Vamos?
- De quantos nãos você precisa?
- E você, de quantos sins?
- Todos.
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(8 ligações perdidas)
- Não vai atender?
- (...)
- Precisamos conversar. Podemos nos encontrar?
- Sim, mas vou de burca e você de armadura. Que nossas bocas não se vejam.
- (...)
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PS da série “desnecessários”: Pior que aconteceu, e não foi na Nova Zelândia. Há quem diga que eu devia ser mais leve. Leve ou permissiva? Hoje não e amanhã...
Amanhã também.

quinta-feira, 7 de novembro de 2013

Benfazejo

Tantas vezes morri em outubro e ele... ele nasceu. Despretensiosamente, me faz rir. Pretensiosamente, poetiza três a cada duas frases. No meio da conversa canta. Ele sabe que a música está por trás, por cima, por dentro de tudo.

Prometeu-me um bigode como o do Leminski. Mal sabe que aquela barba mal feita já me faz feliz. Não ousei contar, mas não gosto quando me chama de flor. Outro dia arriscou um “flower”, que me lembra power e soou melhor. Vai acertar o tom quando estiver mais perto. Quando reconhecer meu cheiro.

Interrompi a conversa de hoje bruscamente, antes que já não pudesse dormir. Mas, era tarde. Duas horas depois, inda estou aqui, desejando um vinho, um vinil do Luiz Melodia e a respiração dele na minha nuca. Nenhuma pressa e nenhuma roupa – ou alguma – apenas pra que ele vivesse o lampejo de me descobrir.

Menino bom, de fazer (o) bem. E eu aqui, desejando fazer mal. Aquele mal que se faz às virgens, aos caretas, aos celibatários.

De água na boca e alma tão malfazeja, arrisco uma heresia, o peito e uma cafuzice. Só pra descobrir se ele beija assim, como quem vive.
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PS: Minha avó sempre dizia sobre o mundão: “menina, cuidado com os malfazejos!”. Nesse caso, entre a neta e o moço, não sei o que ela diria... rsrsrsrsrs

PS2: Ele sabe. Não foi bem uma "heresia". Talvez uma curiosa provocação.

PS3: Queria dizer tudo em poucas linhas. Jamais serei capaz. Ainda bem. Que sempre fica um pouco, um muito, o outro dia. Essa pode ser a única ou a primeira cafuzice dele. Prazerosamente, nem sei. Sei que finalmente, NOVEMBRO.

PS da Bruna: Em outubro, dei tanto trabalho p/ Iansã que acho que ela nem dormiu... rsrsrsrs. Daí, Dona Bruna me deu de presente essa pérola da Marla, que acalmou o meu remorso de ser sempre TANTO:

"Entre um cigarro e uma fresta de desespero, eu escolho a palavra. Tenho raiva de dores que me calam fundo. Filha de Iansã dos Ventos, eu mudo a direção das chuvas se pretendo outro tempo ou momento. Meu corpo é cais e mar aberto. Meu coração é caos, céu encoberto. Minha mente, esse relâmpago de luz. A escolha é sempre extrema. Não me comovem tuas palavras tão amenas. Então que minha sede traga tempestades e que meus seios incitem teus maiores incêndios. Não gosto de superfícies ilesas, eu busco o de dentro. Posso transformar tristeza em raiva pra sentir mais força. Posso afogar minha doçura num rio de águas tão enjoativas. Mas sei reverenciar o mar que temo.
E quando eu te tiver nos braços, me escuta: você terá a realidade dos teus sonhos.
Não pretenda minha fúria, queira-me mansa. Não pretenda minha mansidão, queira-me intensa. Perceba quando eu digo um sim dentro de um não.
E quando eu te tiver nos braços, me escuta: só te restará a escolha entre a tempestade e o furacão."

Iansã dos ventos
Marla de Queiroz

sexta-feira, 4 de outubro de 2013

Sol-te

“Quando quiser, avise. Te quero bem. Tu sabes, né?”

Tenho dez dedos apontando em outra direção. Tenho pés que voam e alma que morde. Tenho espelho grande. Cicatrizes que parecem tatuagens e que mostram quem eu sou. Não queira ver. Não me queira tanto. Não me ligue. Não ouse escrever como se eu fosse outra. Como se eu fosse louca. Já fui. Já era. Jaz.

E quando a lembrança do meu gosto te perturbar, seja forte. Desligue. Derrame gelo, leite, sangue. Seja outro alguém, que não meu.

Nem tão meu, nem tão seu. Seja outro. Outro cheiro, outro posto. Uma história que não inclua meus cachos, meus seios, meus sins.

Meus porquês, de tão simples, engoliram os teus. Foram-se todos, tomar sol, beber água e gozar daquilo que você nem quis.

Nem quis. Então agora, nem queira.

Eu sou o teu delírio. Teu absurdo mais voraz. Teu perigo mais fundo.

E nem por isso, tua.

Nem por isso, nós. E nem por isso, sempre.

Tão por isso, minha.
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PS da série “desnecessários”: Ele sente o cheiro. Sempre que chego perto demais de mim, ele vem. Ele tenta. Sorri como se eu devesse royalties da minha alma. Como se ele, soubesse mais que eu.

PS desimportante: Te amo tanto que te odeio. Há anos. Há 116 cafuzices (se puder, releia a primeira, aqui mesmo: Erros Púrpuros de Português – Abril/2008). Li tua mensagem embaixo daquele Sol. Sol-te.

Ainda assim, e muito mais assim... MINHA.

PS digno: "Sol-te" é coisa do Leminski... claro.

sexta-feira, 30 de agosto de 2013

Final feliz

Ela, desconfiada desde o nascimento. Ele, com um medo danado de tropeçar de novo que o último tombo tinha lhe arrebentado os joelhos e a alma. Viviam os dois trocando os curativos, desviando olhares, acelerando o passo. Comemorando os segundos que podiam resistir sem olhar pra trás. Como respirar embaixo d'água. Como morrer de saudade e no dia seguinte acordar. Vivo.

Na primeira vez, tão ensimesmados, nem se viram. Nem sorriram. Foram-se, cada um na direção que lhes cabia no mapa. Aquele caminho de sempre com gosto de nada. As mesmas curvas, barrancos e pontes. A segurança, o mais do mesmo. A boca cheia e as mãos vazias.

De presente das circunstâncias, a segunda vez e nenhuma certeza. Algum ensaio de sorriso, um querer que de tão tímido quase desculpava-se por existir (e insistir). Ali, na frente um do outro, era perto demais. Era um desacato. Desses atrevimentos da vida, quando a gente só precisa destrancar a porta e deixar a luz entrar. No escuro, passaram três dias pensando em qual esquina - em qual cidade - haviam esquecido as chaves.

No quarto dia - predestinado para irem embora, ele vestiu os óculos. E foi ela quem enxergou melhor. Pegou a estrada julgando que os quilômetros a salvariam. Mas eles se confundiam com as horas, com as palavras, com a pele imaginando o gosto dos quase duzentos centímetros daquele homem. Era muito. Alto, perigoso. E longe.

Ele, inconformado. Já não podia voltar pra casa sem ela. Soprou o medo e levou com ele todas as pequenas lembranças. Revivia as cenas do final de semana tentando encaixar os sinais, as possibilidades. Que fosse, precisava achar um único "porém". Suficiente pra sustentar a loucura que estava prestes a experimentar.

O dia seguinte veio cheio de uma distância física que foi comedidamente substituída por aquele estranho "estar" um no outro, necessariamente. Surpresas sutis, segredos, confissões. Foram se entregando, se contando, se encantando. Duvidando também, que não eram loucos.

Agora são. Loucos, apaixonados, consumados e consumidos.

Quarenta e seis dias depois, ela cabe nos braços dele como ninguém. Ele - com ela, já nem cabe em si.
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PS: Casal necessarie... Dá gosto de ver. Como diria meu Muso, "estamos espalhando amor entre os povos"... hahahaha

A música é o meu presente. Coisa de público que assiste e aplaude:


O Amor É Filme

Cordel Do Fogo Encantado

O amor é filme
Eu sei pelo cheiro de menta e pipoca que dá quando a gente ama
Eu sei porque eu sei muito bem como a cor da manhã fica
Da felicidade, da dúvida, dor de barriga
É drama, aventura, mentira, comédia romântica

O amor é filme
Eu sei pelo cheiro de menta e pipoca que dá quando a gente ama
Eu sei porque eu sei muito bem como a cor da manhã fica
Da felicidade, da dúvida, dor de barriga
É drama, aventura, mentira, comédia romântica

Um belo dia a gente acorda e hum...
Um filme passou por a gente e parece que já se anunciou o episódio dois
É quando a gente sente o amor se abuletar na gente tudo acabou bem,
Agora o que vem depois

O amor é filme
Eu sei pelo cheiro de menta e pipoca que dá quando a gente ama
Eu sei porque eu sei muito bem como a cor da manhã fica
Da felicidade, da dúvida, dor de barriga
É drama, aventura, mentira, comédia romântica

É quando as emoções viram luz, e sombras e sons, movimentos
E o mundo todo vira nós dois,
Dois corações bandidos
Enquanto uma canção de amor persegue o sentimento
O Zoom in dá ré e sobem os créditos

O amor é filme e Deus espectador!

"- A gente devia ser como o pessoal do filme, poder cortar as partes chatas da vida, poder evitar os acontecimentos!
Num é?!?!"

PS da série "desnecessários": 99,9% não vai entender, mas o objetivo é acertar no peito desse 1%. Divagações reveladoras sobre a etimologia da palavra "estrangeiro":
http://revistalingua.uol.com.br/textos/67/artigo249108-1.asp

quinta-feira, 25 de julho de 2013

Birutas

Eu teria preparado o jantar. Alguma receita nova e ousada que merecesse o teu gosto e o meu. Teria escolhido um incenso que perfumasse até o meio-fio. Um vinho que fizesse sentido. Que intensificasse as horas embebedando cada segundo, cada centímetro cúbico de pele, cada ensaio de palavra.

Teríamos dançado. Ou tentado. Contaria do café que tomei à tarde naquela livraria onde teria reencontrado um velho amigo. Você se despiria de todo o cansaço, de todas as responsabilidades com o futuro. O futuro é um casaco pesado, cheio de bolsos, com cheiro de mofo. Te envelhece e me faz espirrar.

Teríamos expulsado o frio. Você certamente faria graça e eu poesia. Ou, você poesia e eu graça. E os dois, música.

Então, teríamos florescido. Germinada no teu peito eu cantaria qualquer coisa que te fizesse bem. Até o hino do Botafogo.

E adormeceríamos com aquele sorriso bobo. Aquele gosto bom de estar um no outro sem pressa e sem contraindicações.

Na manhã seguinte, seríamos primavera. Teríamos enlouquecido ainda mais. Estranhamente felizes.

E eu seria, ainda e mais

sua.
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PS dele: Quero muito você. Mas por enquanto, três outros caras têm se revezado p/ me suportar: Chico, Leminski e Almodóvar. E o Bibo também, pq às vezes sobra p/ ele... rsrsrsrsrsrs
Aproveita que o Papa tá aí... pergunta se temos salvação.

PS do casal nécessaire: Que lindooooooooooooooooooo! Rsrsrsrs. Façam-se bem. O resto é supérfluo... 

PS da série “desnecessários”:
BIRUTA
(francês biroute)
s. f.
1. [Aeronáutica] Mecanismo que consiste numa espécie de manga de tecido colocada no alto de um mastro para indicar a direção do vento.
2. [Brasil, Informal] Que ou quem se deixa influenciar facilmente.
adj. 2 g. s. 2 g.
3. [Brasil, Informal] Que ou quem é um tanto doido. = AMALUCADO, ATOLEIMADO, MALUCO
(http://www.priberam.pt/dlpo/default.aspx?pal=biruta)

quinta-feira, 11 de julho de 2013

9 de Julho

Depois de alguns dias dormindo nos braços dele, meu quarto perdeu a graça.

E eu podia dizer que é só um Rato me fazendo falta. Fazendo cócegas nas lembranças, fazendo eco em todas as nossas divagações. Mas, não é só isso. É tanto. É uma cumplicidade sem-vergonha. Aquele cheiro e aquela graça dele. Aquela gentileza natural, aquele jeito de me pegar no colo com o olhar.

Aquela febre, aquele impulso de ser dele. E todos aqueles segredos espalhados na varanda. Vento forte, nossa história, nossos goles, nossos beijos. Entrelinhas nuas. A madrugada virou um espetáculo particular. De canto e percussão.

Eu, que era tão minha, nele quero demorar. Quero mais que ele venha com força, com fome, comigo.

Quatrocentos quilômetros depois, sou mais ele. Sou mais eu.

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PS dele: Meu Rato... tão atento aos detalhes. Os meus e os do mundo.
Quase te trouxe na minha necessarie. Mas, entre os artigos absolutamente necessários, você precisa de muito espaço pra ser tanto e merece uma cidade só sua. Eu, fico aqui pensando que desejo e saudade talvez andem juntos. E que durante esses dias, ganhamos tanto um do outro que não cabe aqui.

O título do texto é pra lembrar que na madrugada cantamos 1º de julho como se ninguém estivesse dormindo e como se não houvesse amanhã... rsrsrsrsrsrs.

PS dos companheiros da trip: Agradecimento à Bruninha, que tem cumprido com louvor a sua missão na terra. À Carlinha e ao Júnior, que nos deram de presente a Gigi e garantiram várias risadas no findi. À Lígia que também foi cúmplice dessa aventura e tem sido de tantas outras. E ao Dani que me acompanhou no Jack e consertou nosso chuveiro com uma lixa de unha e um esparadrapo. Tô bem de amigos, né? Obrigada, muito obrigada!

domingo, 30 de junho de 2013

É o que temos para hoje

Faltava a metade da lua, mas sobravam sombras e dúvidas.

Na cerveja havia mel. A caneta vermelha enfeitava a mesa, mas cansava os olhos incitando um desejo que queria mesmo era dormir.

O amor, aquela piada velha que alguém lembrava depois da terceira dose. Quando eu, ria sem sorrir.

Que merda. Não era a hora de voltar e ainda assim, ele estava ali. Com um repertório duvidoso e o bolso cheio de interrogações. Queria casar. Queria me pegar no colo e fugir. Mas no peito eu só tinha guardado um ponto final. Só. Um perigo, que com mais dois – dois segundos, dois passos, dois pontos – virariam reticências.

Rebeldes e inoportunas reticências. Malditas sejam... tão cheias de vãos e talvez.

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PS: Se um ponto faz falta, imaginem dois.

PS do Bibo: Meu parceiro, meu cúmplice, meu amigo, meu orgulho. Leu o rascunho 5h da manhã e disse: eu captaria sem nenhum PS. Ah, tão bom ser captada assim. Dá gosto. Obrigada pelo carinho e respeito de sempre. Sempre.

quarta-feira, 19 de junho de 2013

Língua

Não era saudade. Era desejo. Mais grave, mais fundo. Visceral. Aquela certeza que o peito dele era o melhor lugar pra descansar do mundo. E voltar. No vento, espalhando inspiração feito semente de flor.

Predileção precipitando um roteiro, um caminho, um sorriso. Bom-humor e péssimas intenções. Das péssimas, as melhores. Guardadas pra serem entregues com laço vermelho, cinta-liga e nenhuma maquiagem.

Sem espaço pra fantasias, que em todos os vãos ecoavam aquela absurda e simples verdade. Cada um com a sua cidade, seus planos, suas línguas, dúvidas e convicções. E um querer quase bobo de tão natural.

Que a distância nos proteja.

Amém.
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BANDEIRA
Zeca Baleiro

(...) Não quero medir
a altura do tombo
Nem passar agosto
esperando setembro
Se bem me lembro

O melhor futuro
Este hoje, escuro
O maior desejo da boca
é o beijo
Eu não quero ter o tejo
escorrendo das mãos

Quero a Guanabara
Quero o rio Nilo
Quero tudo ter
Estrela, flor, estilo
Tua língua em meu mamilo
água e sal (...)
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PS Dele: Adorei o roteiro. E todas as nossas divagações.

PS Justificável: Brisas notívagas soprando a mais de 400km.

PS da Amandinha: Quase pronto. Nada como uma trip no final de semana p/ concluir... que faltam alguns pingos nos Is.

domingo, 9 de junho de 2013

Muralha

Para ela, amor era bicho estranho. Bicho que não podia entrar em casa e precisava caber no seu quintal.

Por vezes, experimentara dias sem abrir a porta, testando o apreço e a força do animal. Quando ele quase esquecia seu rosto e seu calor, aparecia sorrindo, com água, comida e um abraço. Fraco, fazia festa. Feliz, fazia amor.

Mas ela corria de súbito. Voltava à segurança dos azulejos que escolhera para enfeitar a rigidez das paredes da casa. Fechava a janela e o coração. Espiava escondida contando os segundos que dignificavam o sacrifício, a planejada negligência e ele ainda ali. Era mesmo amor?

Bicho estranho, louco, estupidamente forte. Quanto tempo resistiria? Quanto sobreviveria cercado no quintal da moça, vivendo de pão e expectativas?

Precisava de carne. Quase leão, quase louco, queria era mordê-la logo, abrir os portões e roubá-la pra si.

Que afinal, não era bicho de quintal. Era selvagem, cheio de músculos, cicatrizes e sorrisos. Caçava bem. Vivia bem. Mas, desde que a vira, decidiu que não precisava de tanto. Precisava dela.

Ela, temerosa. Que além dos portões, o perigo do imprevisível. Podia ser frio, podia chover, podia ser “não”. Não deixava o amor entrar em casa, mas também não o deixava partir.

Paciente, como os bichos que entendem de alma e desejo, o amor via o dia passar. À noite pensava em invadir a casa, surpreendê-la descalça, abrir-lhe as janelas e o sutiã.

Contido, não queria assustá-la. Queria inteira e lúcida aquela moça, linda de tanto receio, de tantas trancas e botões.

Concentrava-se em não desistir. Que o caminho mais fácil era pular logo aquele muro e correr, até que a lembrança dela perdesse a cor.
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PS esclarecedor: Eram duas laranjas: uma amava e a outra...

Também.

Leandro Henrique, adorei e adotei o conceito das laranjas já que elas estão em todo o lugar... rsrsrsrs.

PS dos protagonistas: Ninguém vai dizer o que fazer, nem porquê, nem quando. Se uma casa com quintal é pouco, talvez vocês precisem de um espaço maior. Aqui fora, esperamos ansiosamente. Venham respirar...

terça-feira, 4 de junho de 2013

Fogo

Final de maio, mas o Rio era de Janeiro. No peito, fevereiro – quase março. Carnaval. Sem fantasia, sem hora. Um drink, um cigarro e a liberdade do vestido longo, solto. Leve.

Noite fresca de maresia e lua minguante, que na verdade, parecia crescer. Ele com frio e eu com calor. Só sabia meu nome, mas chegou tão perto que pensei em correr. Eu... tão bem que não queria intervenções. Dei-lhe as costas. Ainda assim, se aproximou até que eu sentisse na nuca e sopro das suas intenções - já decidido a me tomar. Apontou as milhares de estrelas que prenunciavam o Sol da manhã seguinte. Obedeci. Segui com os olhos a direção do céu. Na Terra, o lábio dele por um segundo tocou algum ponto entre minha pele e a minha alma.

Tarde ou cedo demais? Pedi licença, exercendo minha autonomia diante desses acasos do universo. Andei, andei, andei. Deixei a música entrar. O vento brincava com o meu vestido e experimentei aquele gosto bom... de ser a dona da minha história e das minhas verdades, tão caras.

Ruas e desencontros depois, eis que alguém chamou meu nome, no meio daquela multidão de pensamentos e pessoas. Era ele, que eu abracei sem pensar. Que era coisa de sentir e não de pensar. Era de viver.

Vivos. Nem nossos olhares se largaram mais. Em muitas horas e poucos dias, páginas inteiras de descobertas impublicáveis.
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PS: Entre pseudo-príncipes, patos, cavalos e burros, há anos me encantei pelo Rato apaixonado do Palavra Cantada, sem contar a analogia que a Clarice Lispector lindamente desenhou na crônica “Perdoando Deus”, divagando sobre o amor e um rato.

Eis que me deparo com um Ratão que toca bateria, aponta as estrelas, fotografa com os olhos e não se conforma com os paulistas fazendo coro com os Racionais (“calor insuportável/28°”). Afinal, é um carioca de 40° e com 25° sente frio.

PS dele: Eu te abracei e disse: Quanto tempo! rsrsrsrsrs. É que além do Sol, as estrelas avisaram sobre o Fogo. Mas também vale uma menção ao seu Botafogo... E vale agradecer pela inspiração?

PS dos PSs: Pra quem não conhece:
Palavra Cantada – O Rato: http://www.youtube.com/watch?v=E-rXYoax60Me

terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Formigação

Disse o fulano que eu fujo. Ele, tentação. Liga dez vezes e eu atendo duas. Às vezes, meia. Que inteira é muito fundo, muito denso e reciprocidade demais é um perigo.

Confesso que se não atendo é por preguiça. Exausta de tanta cumplicidade vã. Ser assim, desvendada nas primeiras sílabas devia ser proibido. Corrupção de sonhos e emoções e eu... quero evitar a fadiga. Meus segredos já não se precipitam por aí. Economizam os passos porque dia ou outro o joelho esquerdo reclama. Dói feito cotovelo de ex.

Se atendo é que estou suficientemente distraída. Quando desejo rir com as notícias tão boas quanto amenas, cócegas nas cicatrizes. Como se ele não fosse o cara da história. Como se a história nem fosse minha.

Ao telefone é simples, sim ou não e o dedo desliza fácil. Indolor entre os botões, como um farol - verde e vermelho. Pior se ele sondasse a minha porta. Pior se ele tocasse a minha pele (e a minha vida).

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A Montanha Mágica
Legião Urbana

Sou meu próprio líder: ando em círculos
Me equilibro entre dias e noites
Minha vida toda espera algo de mim
Meio-sorriso, meia-lua, toda tarde
Minha papoula da Índia
Minha flor da Tailândia
És o que tenho de suave
E me fazes tão mal

Ficou logo o que tinha ido embora
Estou só um pouco cansado
Não sei se isto termina logo
Meu joelho dói
E não há nada a fazer agora

Para que servem os anjos?
A felicidade mora aqui comigo
Até segunda ordem
Um outro agora vive minha vida
Sei o que ele sonha, pensa e sente

Não é coincidência a minha indiferença
Sou uma cópia do que faço
O que temos é o que nos resta
E estamos querendo demais

Minha papoula da Índia
Minha flor da Tailândia
És o que tenho de suave
E me fazes tão mal

Existe um descontrole, que corrompe e cresce
Pode até ser, mais estou pronto prá mais uma
O que é que desvirtua e ensina?
O que fizemos de nossas próprias vidas?

O mecanismo da amizade,
A matemática dos amantes
Agora só artesanato:
O resto são escombros

Mas, é claro que não vamos lhe fazer mal
Nem é por isso que estamos aqui
Cada criança com seu próprio canivete
Cada líder com seu próprio 38

Minha papoula da Índia
Minha flor da Tailândia
Chega, vou mudar a minha vida

Deixa o copo encher até a borda
Que eu quero um dia de sol
Num copo d'água
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Clássico PS: Talvez ele tenha sido o meu Diego Rivera, grande, austero, talentoso, impetuoso. Eu, a Frida enciumada e ensimesmada que de tanto pintar meu auto-retrato, um dia me reconheci.

PS2: Cafuzei-o.

PS3: O Haikai perfeito, presente da Menina Sacomani (minha tão querida e tão-tanto-mais que nem cabe em si), merece mesmo um PS:

“Não limpo a mesa
das migalhas do pão
Resta a formiga”
(cassiocarvalheiro@yahoo.com.br – Assim o autor assina o mini-livro de Haikais que ela me deu)

Enfim, algumas formigas merecem viver e antes de dormir é provável que repitam, emocionadas: (...) A migalha nossa de cada dia nos dai hoje: Amém.