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quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Sem açúcar

Durante alguns dias, ela esperou que ele voltasse. Desculpando-se pelo descuido e devolvendo-lhe todos os beijos, todos os sins.

Tinha ainda aquela certeza de que faltavam-lhes algumas páginas. Sozinha tudo o que ameaçasse rascunhar seria triste. Seria mudo. Um luto de emoções e pontos de interrogação ecoando no escuro.

Sem os pingos, os Is cambaleavam bêbados ao som de Piaf, deprimindo até as mais convictas exclamações.

Sentir falta dele era a mais medonha de todas as culpas que experimentara. Os dias em preto e branco. A vida indo e vindo, sem açúcar. Sem explicações.
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PS: Estava quietinha, debruçada sobre meus silêncios. Daí, tarde da noite recebi uma mensagem. Tarde da vida. Mas esse texto é em homenagem a outra mensagem. A que não recebi ainda e talvez nunca mais. Mas, se é nunca, como é que pode ser “mais”?

PS2: Dona Bruna, essa é mais uma das Cafuzices que é tão minha quanto sua. Meu presente pra vc, que é tão presente. Privilégio meu tê-la por perto, tão dentro, tão sensível aos arranhões da minha pele e do meu coração. Um brinde à cura, sua missão... meu privilégio.

PS3: Outubro totalmente sem açúcar, mas tô abusando do mel. Novembro de dias doces (e foram só dois)... rsrsrsrs

domingo, 2 de outubro de 2011

Tâmara seca

Naquela manhã, acordar foi como nascer sem pai ou mãe. Um susto. Foi como se, pela primeira vez seus quarenta e poucos anos fossem tão explícitos.

A vida tinha cheiro de café. Os filhos adolesciam insuportavelmente. Às vezes, já não lhe desejavam nem bom dia. O marido se quer lhe desejava. Entreolhavam-se através das frestas, portas semi-abertas, cortinas e memórias sutis. Como se houvesse um pacto de cordialidade morna. Um pacto de paz. Ocorreu-lhe que aquela paz nada tinha a ver com a paixão louca que arrebatara o casal vinte anos antes. Percebeu que agora o amava como a um filho... adolescente, também. Oferecia-lhe aquele perdão que só as mães são capazes e era esse o segredo que sustentava o casamento – especialmente nos dias em que a pedra era só uma pedra. Aqueles dias sem romance, sem poesia, nenhuma pequena tragédia familiar que exigisse dela a capa de super-matriarca a salvar o mundo.

Andou pela casa feito uma estranha. Feito um fantasma de si mesma. Reconhecendo em cada canto que nada ali precisava dela. Nada dependia dela para “ser”. A reforma acabara, o sonho construído... todos os detalhes arranjados com cuidado. Do jardim observou a fachada. A casa era grande, bonita. De uma harmonia que agora sufocava. Por um momento, duvidou que cruzaria novamente aquela porta. Duvidou que fizesse parte daquela felicidade mórbida.

Precisava entender. Precisava novamente caber em si ou explodir de vez... não suportaria represar aquelas inquietações nem mais um segundo.

Na garagem, o carro do marido com os vidros mais abertos que fechados pareciam-lhe sorrir. Um convite, um plano de fuga. Plano B. Mas faltava-lhe um roteiro. Faltava-lhe o ar.

Decidiu ir. À quitanda, à padaria, qualquer lugar. Mas, o que compraria se naquela casa nada faltava? Desesperadamente, nada faltava. Frutas, botões, antissépticos... tudo havia ali.

Tirou a chave do contato, com medo que o som do motor lhe desse alguma direção. Alguma irreversível. No retrovisor, sua vida. Aquele rosto pálido, cansado, sem cor. Trêmula, deixou que o controle e as chaves escorressem pelos dedos.

Buscou um resto de coordenação para alcançar a chave, embaixo do banco. Primeiro encontrou um celular – reconheceu que era do marido (aquele que ela já não reconhecia). Tateou mais alguns centímetros e no mesmo cantinho encontrou o chaveiro e... um batom.

Batom gasto, cor de tâmara. Marrom-avermelhado e levemente cintilante. Pensou em mordê-lo. Pensou em guardá-lo, ou deixá-lo cair novamente embaixo do banco. Mas era tarde para esquecê-lo.

No celular do marido, passeou pela agenda, pelos arquivos, mas não havia mensagens e até o histórico de ligações o danado havia apagado.

E ela, que é que faria do batom e da sua vida? Principalmente, que é que NÃO faria?

Resolveu ir além. Tentaria todos os nomes e todos os números desconhecidos daquela agenda, até que alguma coisa fizesse sentido. No mundo.

Em ordem alfabética, foi descartando algumas conhecidas... a tia, a amiga de infância, a secretária que intermediava alguns eventos importantes, a professora do filho. Mas ali mesmo, na letra “A”, um nome lhe chamou a atenção. Repetiu-o três vezes olhando fixamente o movimento que os lábios nervosos refletiam naquele retrovisor.

Não teria coragem de ligar para a fulana – senhorita “A”. Então, enviou-lhe uma mensagem. Que mal haveria de ter? A fulana pensaria mesmo que era seu marido:

“Oi. Perdeu um batom? Cor de tâmara. Achei no meu carro.”

Ao que Dona “A”, respondeu quase que instantaneamente: “Ainda bem que foi você que encontrou”.

Que espécie de resposta era aquela? Que direito fulana “A” tinha de ser tão... tão vaga? Era um desrespeito àquela angústia e por isso, insistiu:

“... é seu ou não?”

“Sim. Meus! Você e o batom”.

Devolveu o celular embaixo do banco. Largou a chave no contato. Antes que pudesse chorar, preencheu os lábios com uma forte camada daquele batom. Cor de tâmara. Desejou ser inteira uma tâmara suculenta. Cintilante.

Saiu a pé. Sem pressa. No bolso uma lágrima pra derramar depois. No outro, o batom.

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PS: É que essa história ficou martelando meus instintos antes mesmo de acontecer. Se é que aconteceu. Ficção ou auto-ficção?

Ah, cafuzice. Cafuzice pura.

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Samurai da Vila

Quisera ele ter vivido um amor de novela. Manso como um romance vespertino, trágico como se o horário fosse mesmo nobre. Mas, o seu era amor desgraçado, infecundo - e morava em todas as horas. Doía a cada fração de segundo. Embrulhava-lhe o estômago aquele coração entalado, aquela dúvida ingênua roubando-lhe o oxigênio e a lucidez.

Afinal, haveria alguma chance?

E ter esperança era como uma agonia densa que não dorme. Que não come. Esperança órfã, pegajosa, imunda, espalhando-se feito erva daninha na alma.

Prisão perpétua aquele amor. E perpetuá-lo dava-lhe enfim a sensação de uma vida póstuma (sem ELA). Afinal, existe vida após o amor? Sobreviver era o prêmio àquela devoção?

Cego, surdo, fraco – feito doente terminal – seguia os passos da amada. Torturava-se observando-a de longe.

Enquanto ela... ia tranqüila. Linda. Mãos dadas à vida da qual ele não fazia parte.

Manco de amor, escondido atrás de si mesmo, analisava cada traço do rosto da moça, cada sorriso, cada cadência. Esperando que um fio de cabelo fora do lugar denunciasse um sinal. Um vacilo. Um talvez... a recíproca.

Um milagre.

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♫... Pedaço de Mim
(Chico Buarque)

Oh, pedaço de mim
Oh, metade afastada de mim
Leva o teu olhar
Que a saudade é o pior tormento
É pior do que o esquecimento
É pior do que se entrevar

Oh, pedaço de mim
Oh, metade exilada de mim
Leva os teus sinais
Que a saudade dói como um barco
Que aos poucos descreve um arco
E evita atracar no cais

Oh, pedaço de mim
Oh, metade arrancada de mim
Leva o vulto teu
Que a saudade é o revés de um parto
A saudade é arrumar o quarto
Do filho que já morreu

Oh, pedaço de mim
Oh, metade amputada de mim
Leva o que há de ti
Que a saudade dói latejada
É assim como uma fisgada
No membro que já perdi

Oh, pedaço de mim
Oh, metade adorada de mim
Leva os olhos meus
Que a saudade é o pior castigo
E eu não quero levar comigo
A mortalha do amor
Adeus
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PS: Lá vai ele (mais uma vez) tentar buscá-la. Como se tivesse culpa, como se faltasse dizer a palavra mágica... alguma que fizesse os olhos dela cederem. E como num surto de clarividência, ela pudesse enfim admitir o amor!

Fã de futebol (e da moça), confessou-me que é uma emoção parecida com a final da Libertadores. Do êxtase absoluto à frustração. Pior... é corinthiano. Que é que não desiste? Que é que tanto sonha com a final da libertadores? Ah, esses amores impossíveis...

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

Pequenez

Não tenho medo de altura, mas uma barata com seus poucos centímetros de ousadia pode fatalmente me desequilibrar. Não tenho medo quando um grande amor se anuncia, mas um beijo despretensioso pode roubar a minha paz.

Adoro os romances com quatrocentas, quinhentas páginas, mas uma frase solta pode desnortear as minhas mais antigas convicções.

Não tenho medo das grandes verdades e são as pequenas mentiras que me apavoram, desprevenida.

E sofro tanto, quando percebo num altruísta aquele vestígio de mesquinhez... aquele egoísmo cego escondido entre as veias de um grande coração.

Ah, são elas. As pequenas. As minúsculas coisas que me preocupam.

Porque é fácil livrar-se de uma mariposa que ameaça pousar nos seus olhos. Mas aquele maldito cisco... é ele que vai nos fazer chorar.
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PS: ... Eu, com essa mania de grandeza, espero sempre que ao me magoar fulano(a) tenha um bom motivo. Um motivo enorme... daqueles dignos de sacrifícios e perdão.

Porém, se por trás do olhar dissimulado houver apenas um pequeno interesse, um desejozinho instantâneo, uma vaidadezinha bem pobre... Lamento. Pequenas causas não me comovem. Emoção chinfrim não enche a barriga (nem o coração) de ninguém. Mas é igual pedrinha no caminho, pra tropeçar. Que se fosse um paralelepípedo, quem é que não enxergaria?

PS2: Leandro Henrique, uma vez divaguei sobre o caco de vidro esquecido atrás do sofá... lembra? Agora são pedrinhas, mentirinhas, bobeirinhas humanas. Ai! As pequenas coisas a me preocupar...

quinta-feira, 4 de agosto de 2011

Solstício de Inverno

Adoro quando ele desiste de ir. E tão pretensioso, fica. Cercando meus olhos como se pudesse tomar todos os meus segredos. À força. Adoro quando não faz a barba, quando esquece a hora, a lente de contato e todos os meus nãos.

Adoro quando ele não sabe o que dizer – e canta. E quando ri com o corpo inteiro, leve. Adoro quando o time dele ganha. E quando me abraça enciumado, invocado, feito dono. Feito meu. Adoro acordá-lo no meu quarto, seu cheiro folheando os livros e os lençóis.

Adoro essas noites frias e (estranhamente) mais longas. Quando ele me ama com uma ternura medieval. Meu plebeu de braço forte, preferindo a rebeldia dos meus cabelos, a timidez da minissaia escondida no fundo do guarda-roupa – lá, perto da minha nudez.

Ele pode. Acender a luz, escolher a música. E voltar.
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E lá no fundo, o vozeirão da Nana Caymmi trazendo a mudança dos ventos, dos tempos, dos versos...

Mudança dos Ventos
Composição: Ivan Lins / Vitor Martins

Ah, vem cá, meu menino
Pinta e borda comigo
Me revista, me excita
Me deixa mais bonita

Ah, vem cá meu menino
Do jeito que imagino
Me tira essa canseira
Me tira essas olheiras

De esperar tanto tempo
A mudança dos ventos
Pra me sentir com forças
Prá me sentir mais moça

Ah, vem cá, meu menino
Pinta e borda comigo
Me revista, me excita
Me deixa mais bonita

Ah, vem cá meu menino
Do jeito que imagino
Me tira essa vergonha
Me mostre, me exponha
Me tire uns vinte anos
Deixa eu causar inveja
Deixa eu causar remorsos
Nos meus, nos seus, nos nossos

La, ia, la, ia, ê / La ia ê
La, ia, la, ia, ê / La ia ê
La, ia, la, ia, ê / La ia ê
La, ia, la, ia, ê / La ia ê

Ah, vem cá meu menino
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PS: Que Deus nos dê paciência. Um com o outro e um NO outro. E coragem pra sempre renovar o desejo e os perdões. E que eu tenha mais mil e um perdões. E que ele tenha todos os motivos. E TODOS mais (especialmente os impossíveis)...

PS: Meire, tão querida... o título é seu. Obrigada por ser a vida inteira minha cúmplice - amada, linda, especial. Meu presente realmente presente... rsrsrsrs.

quarta-feira, 15 de junho de 2011

O GUARANI

Ele voltou. Avisou que estava perto e que queria mais. Queria tudo (de novo). Eu ia longe... Ia solta, cheia de verdades que me custaram caro. Custaram mesmo uma vida – a minha.

Lamento. Que ainda (e sempre) seja amor. Amor no fundo dos olhos e das gavetas. Cada caco num esconderijo diferente. Como se um quebra-cabeças, de uma imagem que nunca se completará. Como a foto de um sonho. Amor de livro, de filme, de lendas que sobrevivem aos séculos. Romeu e Julieta, Sartre e Simone de Beauvoir. Tom e Jerry. Ceci e Peri.

Ah, meu amor. Devolva-me o silêncio que eu te devolvo a paz. Não ligue, não espere, não poetize. A cerveja vai ficar quente. Os dias virão frios. E sem mim, que vou longe... Longe.

Fique bem.
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FORA DE OCASIÃO (tanta gente gravou, mas é a interpretação do Arlindo Cruz que me emociona mais...)
Composição: Arlindo cruz - Jorge Carioca - Marquinhos PQD

Acho que a saudade já te encontrou
Te disse como estou, mas deixa como está
Quando a solidão desperta o desamor
Se quer falar de amor, não dá

Depois do temporal o sol que vai brilhar
Pode não apagar o que aconteceu
Tanta escuridão pode tornar em vão
A luz que acendeu fora de ocasião

Teu navio quis abandonar meu cais
Não adianta mais, correr atrás assim
Pois o nosso amor já chegou ao fim
E não venha procurar por mim, diz outra vez
Pois o nosso amor já chegou ao fim
E não venha procurar por mim
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PS: Eu nem acredito. O blog chegou à 100ª Cafuzice!!!
Aos que lêem, aos que inspiram, aos que criticam, aos que se emocionam...
Obrigada. Obrigada. Obrigada!!!

sexta-feira, 13 de maio de 2011

Mil e um perdões

Lá fora a vida era urgente e barulhenta. Lá dentro, era reencontro e remissão:
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Perdôo o teu silêncio, se perdoares os meus gritos. Perdôo todas as tuas paixões se fores capaz de perdoar as minhas. E se fores mesmo capaz, perdoe os erros que eu repeti por pura falta de criatividade. Que meu repertório era curto, pueril... eu mal reconhecia o amor.

E assim, perdôo todos os teus enganos. Todas as vezes que flagrei outros amores nos teus olhos. Se perdoares também, tudo o que esqueci de nós dois, juro que perdôo essa tua memória viril, quase cruel. Te perdôo, meu amor, por estampar no peito as lembranças que fui largando por aí, distraída.

Por ter partido o meu coração, te perdôo. Por ter partido, quando eu já era sua (e ainda nem sonhava ser minha). Se esqueceres das mentiras que contei em voz alta na cozinha. Se perdoares o eco dos meus cinco dedos estalados no teu rosto. Naquele tapa, ouviam-se palmas à minha rendição. Amor espalmado, se despedindo. Se contorcendo de ciúme e de culpa.

Te perdôo por ter suportado meus absurdos, se me perdoares por não ter atendido tuas ligações. Por todas as canções que cantamos, que dançamos, que choramos... principalmente ser for impossível, devolve-me o perdão?

Que eu te perdôo por ter voltado. E te imploro perdão, por ainda caber nos teus braços. Por ainda merecer teus beijos, tuas dúvidas e teus sorrisos.

Perdoa a minha castidade, meus vícios e meu medos, que em remissão perdôo a tua demora, as tuas verdades. As nossas verdades que, antes não podiam se perdoar.

Meu amor, enfim te perdôo por tudo. Se me perdoares por tanto...

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PS: É que juntos, nunca tivemos futuro. Agora temos passado, presente e mais de mil perdões.

Canta pra mim? Eu ajudo...

Mil Perdões
Chico Buarque

Te perdôo
Por fazeres mil perguntas
Que em vidas que andam juntas
Ninguém faz
Te perdôo
Por pedires perdão
Por me amares demais

Te perdôo
Te perdôo por ligares
Pra todos os lugares
De onde eu vim
Te perdôo
Por ergueres a mão
Por bateres em mim

Te perdôo
Quando anseio pelo instante de sair
E rodar exuberante
E me perder de ti
Te perdôo
Por quereres me ver
Aprendendo a mentir (te mentir, te mentir)

Te perdôo
Por contares minhas horas
Nas minhas demoras por aí
Te perdôo
Te perdôo porque choras
Quando eu choro de rir
Te perdôo
Por te trair


PS2: Claro que tive outros amores, outros grandes amigos. Mas talvez nenhum outro homem conheça minhas dores (e meus sabores) como ele. E o que faltava contar, agora ele sabe. Agora ele tem.

PS3: Ah, meus amigos de alma literária. Perdoem(!) esse texto, que nele são várias pessoas e tempos verbais diferentes. Eu sei. É que nessa história de tantos desencontros, é como se fossemos três ou quatro casais, em vidas e tons ímpares...

quarta-feira, 4 de maio de 2011

Fome

Era fome. Treze anos e nenhum controle depois. Era cantar com o corpo inteiro, dançar como se não houvesse espectadores – que era ele entregue, o único espectador. Os corpos soluçando, as lágrimas e gargalhadas em batalha. Nenhum ferido. Velhas cicatrizes, segredos e sorrisos.

Sem culpa. Alguma pressa e nenhuma pretensão.

O fim de semana inteiro era pouco. Era raso. Então roubamos a segunda-feira. Roubamos até as especulações. Alheias... e a nós, restava o outro. Restava aquela mordida inteira. Que há treze anos, faltava força nos dentes, verdade nos olhos. Faltava-nos o paladar!
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Chega, que o Fábio Roberto já disse tudo com sua música e poesia. E eu não sei se prefiro a interpretação da Márcia Salomon ou a do Lê (A musa ou o anjo malandro?). AH! Ouçam... devorem:

Tenho fome
Composição: Fábio Roberto

Tenho fome daquela comida
Do seu beijo, da sua mordida
Seu abraço, seu cheiro de vida
De sua língua, da doce lambida

E mim. Uma fome sortida
De sabor, de forma divertida
Uma fome delicada e dolorida
Acesa, quente, colorida

Uma fome prevalecida
Do tesão de ver-te possuída
Uma fome profunda, parida
Da loucura santa e pervertida

Uma fome de te por assim despida
Completamente, mas totalmente protegida
E minha fome te será consumida
Pelo corpo e pela alma digerida
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PS: É que eu... precisava documentar o reencontro, a loucura, a saudade que nem admitira.
(...)
Tenho fome
Tenho fome
Tenho fome
Tenho fome

PS2: Ufa! Dona Cafuza de roupa nova. Espero que gostem (ou não), mas comentem. Os outros layouts eram mais românticos... E Dona Cafuza merecia algo mais agressivo... rsrsrsrs. Beijos!

terça-feira, 5 de abril de 2011

Quizumba de Lebara

Neste caso, fiz questão de buscar caneta e papel. Como se existisse entre eles, uma relação sexual. A tinta, o rubor, o borrão... o desejo desenhado nas curvas cuidadosas da minha caligrafia.

E a minha caligrafia tinha péssimas intenções. Arredondava-se insinuante, derramava-se nua, umedecendo o papel e o ar. Escorregava como se no corpo dele. E o corpo dele era meu. Era de uma entrega indecente, a própria injúria. Na gira... inteira dele.

Como se sempre. Como se até hoje, os outros beijos fossem ensaios. Fósseis de uma memória frágil. Que em nenhum houve tanta vida. Tanto corpo. Tanto sangue. Que em nenhum, me perdi como agora. Como uma mulher que ama e desespera e agoniza. Que amar pode ser como morrer...

Ainda se a morte trouxesse logo sua foice... Mas são gotas de veneno pingando nas horas. E precisar dele era aquela sede de quem tem o corpo inteiro incendiado. Incendiando. Aquela urgência de tomá-lo antes, de bebê-lo todo. Engasgada, apaixonada, enlouquecida. Ah, que dentre tantos, era ele que deveria estar entre as minhas pernas, minhas dúvidas, meus sorrisos.

Era ele. Tão ele. Só ele.

O pecado principal. Convite ao baile do inferno, enquanto pontos e giras não tinham fim.

E no meu corpo, doía a sua falta. Doíam as mordidas no ar. Doía na boca aquele outro gosto e na minha pele, o cheiro dele mudava de cor. No colo, no seio, na cadeira bamba, as pernas e o juízo trêmulos.

Era o segredo denunciado. O beijo na alma. A boca cheia d’água, relâmpagos e perdões.
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PS: Agradeço a amiga que emprestou a história, as palavras e o coração. Cinco garrafas de vinho, uma porção de confissões e eis que não consigo dormir. Eis que... outras coisas, outras tantas coisas que não adormecem.
Ai, amiga. Eu diria que você está deliciosamente perdida. Não tenha pressa de se achar que o mundo arde... Prenúncio do inferno. Então, vamos queimar... rsrsrsrsrs.

PS2: Há anos atrás, a Andréia contou que conheceu na rua um poeta-andarilho. Nem deu muita bola. Ele queria vender uns versos e ela só queria ir embora. Mas, bateu o olho no papel e nunca mais esqueceu a frase:
“Desejo consumir teu corpo nú entorpecendo-me no seu gozo morno, sem te deixar a desejar. Quero”
Já que a Andréia não lembra o nome do autor-poeta-andarilho-perdido, lamentamos. Mas, sugiro que o Carlão (declamador oficial da gangue) decore. Que empreste aquela voz quase indecente às palavras que nunca saíram do pensamento da Andréia... rsrsrsrs

PS3: Depois da teoria sobre homens, Pokemons e Pokebolas (by Camilinha), nada me divertiu mais que a teoria da Coxinha (by Thátila)... rsrsrsrsrs. Vamos difundí-las!!!

PS dos PSs:
“Pior que eu já vi meu lado bom na UTI
Meu anjo do perdão foi bom mas tá fraco
Culpa dos imundo do espírito opaco” (Mano Brown).

É isso. Espíritos opacos, não esperem meu perdão. Tenho pouco a perdoar e reservo para as grandes causas. As grandes almas. Àqueles que, independente do que são, SÃO DE VERDADE.

“Entre o corte da espada e o perfume da rosa
Sem menção honrosa, sem massagem
A vida é loka nêgo
E nela eu tô de passagem” (O gênio – Brown – Vida Loka parte II)

segunda-feira, 21 de março de 2011

Dela

Ensaiou durante dias. Meses. Quando o ano chegou, já sabia exatamente o que dizer. Mas, não disse. Esperou que os olhos se acalmassem. Esperou até que pudesse fingir algum controle. Não que pretendesse enganá-la. Queria de volta alguma sensação que fosse só dele. Algum fragmento de sonho que não incluísse a imagem dela. Os cabelos dela. O sorriso silencioso que ela oferecia, como se sofresse de uma beleza que se vinga da mediocridade do mundo.

E naquele domingo, fazia frio. Fazia tempo. Percebeu que não sobreviveria nem mais um dia. Afinal, o que mais poderia perder, se tudo o que conhecia era a falta? Brusca, mórbida, amarga. Se antes de conhecê-la, a própria vida lhe faltava?

Armado até os dentes, foi buscá-la. Mas era sempre aquela inércia, aquela hipnose, aquele desejo púbere que lhe fazia tremer as pernas e as palavras... era quando engolia as confissões e derramava-lhe amenidades. Como era doce fazê-la rir!

Quando finalmente ela desceu do carro, ele se deu conta de que não havia dito. Nada havia feito para impedir que ela, mais uma vez, se despedisse como se de um amigo. Talvez o melhor amigo. Engraçado, generoso – apaixonado.

Quis puxá-la pelo braço. Quis esfregar-lhe nos lábios, com força, o amor. Quis desposá-la ali mesmo, no meio da rua. No meio daquela vida chinfrim.

Mas, ela foi embora. E ele ali, dentro do carro, esperando a coragem enquanto desejos e pessoas desfilavam distraídos na calçada. Outros amores e segredos caminhavam pela rua e ele se dava conta de quantos nunca seriam felizes. Quantos perderiam o fôlego e a razão.

No celular, digitou o número dela como se disparasse a metralhadora (e o coração):

- Preciso falar.
- Pode falar.
- Tem que ser pessoalmente. Você pode descer? Estou na frente do prédio.
- Ainda? Mas já faz uma hora que me deixou!
- Já faz quatro anos. É que... eu te amo.
- (...)
- Não tive culpa. Não tive escolha. Amo você.
- Eu também... não tenho culpa. Se pudesse, adoraria ter escolhido você.
- (...)

E ele desejou que o telefone fosse mesmo uma metralhadora. Teria destruído tudo. Tudo o que não era seu. Tudo o que acabara de dizer.

Juntando os pedaços, ligou o carro e foi embora. Nem sabia pra onde. Sabia que, entre todas as possibilidades, ninguém seria como ela. Ela, que enfim, não era dele.
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PS: É que ele é um dos homens mais fortes que conheço. Desde menino. Desde o vale das frustrações. Daí, olhou pra ela e sentiu tudo o que ouvira dizer. Tudo o que lera sobre o amor. Tudo o que era impossível. É que ELA era impossível.

Ah, meu querido. Agradeço o a confiança. É um privilégio estar por perto. É um privilégio emprestar meu ombro e chorar com você. Aliás, não empresto. Te dou. Com o respeito e admiração de sempre. Que amizade (verdadeira e completa como a nossa) é daquele tipo de amor que não precisa doer pra ser bom... Beijo enooooooooorme!

E a música, só podia ser essa (o Jairo que me desculpe, mas adoro a interpretação da Marisa Monte... rsrsrsrs):

Para Ver as Meninas
Composição: Paulinho da Viola

Silêncio por favor
Enquanto esqueço um pouco
a dor no peito
Não diga nada
sobre meus defeitos
Eu não me lembro mais
quem me deixou assim
Hoje eu quero apenas
Uma pausa de mil compassos
Para ver as meninas
E nada mais nos braços
Só este amor
assim descontraído
Quem sabe de tudo não fale
Quem não sabe nada se cale
Se for preciso eu repito
Porque hoje eu vou fazer
Ao meu jeito eu vou fazer
Um samba sobre o infinito
Porque hoje eu vou fazer
Ao meu jeito eu vou fazer
Um samba sobre o infinito

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Sete vidas

Selvagem demais pra ser humano. Indecentemente carnívoro. Felino, até no tom da voz. No topo da cadeia alimentar, olhou-me com fome. Com força. Como se anunciasse que tentar correr seria pior. Que ele não cansa. Que ele é mais forte. Que ele, simples e instintivamente, quer.

Se serei mesmo devorada, se terei o desenho das suas garras no meu corpo, se serei de fato o banquete – presa de chocolate, café com leite, cupuaçu...

Ah, antes preciso saber se sua boca é mais forte que a minha. Se seus dentes são mais mordazes que os meus. Se meu veneno não o fere, se uiva tão bem quanto beija. Se deseja, do inicio ao fim, assim... como quem respira, como quem mastiga. Dono de si mesmo, sem guardar a fome pro jantar.

Que eu... eu me lambuzo. Sou bagunceira. Sou cafuza com listras felídeas.

Sou nua, enxergo melhor no escuro. Gozo à luz da lua. Sou de anoitecer...
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PS: Lá vem confusão... Se é ela que move o mundo (e a poesia)! Ah, Felino. Quero tanto quanto você... Todos os outros beijos. Todo o perigo. Toda a transpiração fora de hora. Vamos quebrar telhados e padrões, acordar os vizinhos, e cair de pé...
Natureza danada. Culpa dela. E dos sorrisos... sete vidas pra devorá-lo.

PS2: Ratos: corram!!! rsrsrsrsrs

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Cais

Poucas vezes tive tanta certeza de que era, finalmente, hora de ir... A vida exigindo uma resposta altiva. A minha vez de provar que todos esses anos no mundo cãoporativo não havia endurecido o meu coração. Toda a urgência da moral capitalista não havia feito de mim aquela chefe medíocre, hipócrita, com cara de quem comeu e não gostou.

Ah... eu não! Que comi e gostei. Fiz tudo o que acreditei. Tinha humanidade em todos os meus tons. Até nos mais graves. Principalmente nesses... que a criticidade escancara as verdades e oferece uma espécie coletiva de nudez. Era eu mesma, ué. Lado A, lado B e todas as músicas incidentais.

Minha hora. Hora de agradecer, também. Que hoje senti nos abraços, nas lágrimas, nos silêncios... senti tudo o significou. Senti que minhas meninas cresceram. Ah, cresceram tanto. Nem sabem o que me deram.

Significaram toda a minha carreira, todos os meus sacrifícios, dúvidas e responsabilidades, num dia. Numa tarde, pagaram dez anos da minha vida.

E nunca mais tiram de mim esse sorriso. Essa certeza de que valeu a pena experimentar. Confiar. Ah, confiança também é uma espécie de amor.

Fico aqui toda receosa, que não presenciarei os próximos passos. Mas, tropeçar é fundamental. Eu mesma, tropeço agora. Descanso um pouco. E vou levando mais essa saudade. Tão bonita!
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PS: Ari, Brú, Jú, Gabi, Rafa, Rê... prazer imenso tê-las na minha vida. Paty, prazer imenso perdê-la de novo... que é isso que faz os nossos reencontros especiais. Agradeço ao Zé também, que me ensinou uma escolha corajosa: hoje, prefiro rir.
Monkey, não fica com ciúme. Também amo você... rsrsrs
Aprendi tanto, que aqui não caberia. Aqui, são só as minhas cafuzices.

PS do meu poeta vivo preferido: É que quando essa decisão começou a inquietar meu peito, eu não conseguia dormir. Nem falar, nem sorrir. Daí ele resolveu tudo. Me fez parar. Ouvir. E chorar:

Cais
Composição: Milton Nascimento/Ronaldo Bastos

Para quem quer se soltar invento o cais
Invento mais que a solidão me dá
Invento lua nova a clarear
Invento o amor e sei a dor de me lançar
Eu queria ser feliz
Invento o mar
Invento em mim o sonhador
Para quem quer me seguir eu quero mais
Tenho o caminho do que sempre quis
E um saveiro pronto pra partir
Invento o cais
E sei a vez de me lançar

domingo, 6 de fevereiro de 2011

(EX)Porta-bandeira

De longe, eram o casal mais importante da escola. De perto, era muito longe. O samba ardia nós pés e nos sorrisos cansados. É que felicidade também cansa. Dói e acaba na avenida o sonho de um ano inteiro. Duas vidas inteiras. É que eram feitos daquele amor girando, suando, de pé. Ela mantinha a bandeira no alto, mas quando a saia rodava é que era emoção. Os olhos passavam por ele marcando o desejo de voltar. Ia... como gostava de Ir! Era como ventar. E voltava, para vê-lo devolver-lhe o equilíbrio com as mãos.

Então desfilavam, de mãos dadas. Faltava o fôlego e o coração exagerava, que também queria sambar. Com a ponta dos dedos, ele a dizia o que fazer... então giravam, sorriam – e perdiam-se... que sem as mãos, nada mais se davam.

E percebeu que o que mais gostava naquele mestre-sala era a maneira como guardava os olhos sob o chapéu. Mas, era o mesmo chapéu que garantia-lhe os dez centímetros de distância e sombreava as verdades e os ensaios de amor.

Rodando, lembrou-se que ele nunca fechava os olhos. E como é que seria capaz de sentir, se não os fechasse? Como é que seria capaz de vê-la?

Daí perdeu o passo, o jeito, a paz. Escapou-lhe a letra do samba-enredo. A bandeira estampava uma causa que nem era sua. Ficou tonta, mas girando viu tudo. Tudo! E na volta, já não alcançava as mãos dele. Nem as pontas dos dedos, nem o olhar. Tropeçando em si mesma, caiu.

Soube que naquele ano, além da cumplicidade, perderiam o carnaval. Perderiam o que nunca haviam tido. Perderiam-se...

O ensaio acabou. Desceu do salto e a bandeira descansava no chão. O mestre-sala beijou-lhe o rosto, como se a perdoasse por esperar que ele sempre estivesse ali, oferecendo-lhe as mãos. Ele a perdoava, enfim. Mas, ela já não era capaz de perdoar-se. Dançando com ele, algumas vezes, teria mesmo que cair. Distraído debaixo do chapéu, não percebeu que ela jamais voltaria.

Quem sabe em outra escola – outra fantasia...

Foi experimentar quem seria sem a bandeira, os holofotes e a bateria. Foi sambar a vida, sem idéias geniais ou apurações.

Pisou no pé do diretor de harmonia e sorriu. Quis mesmo machucá-lo. Quis provocar no mundo alguma dor que fosse... humana. Sorriu mais. Sorriu sempre. Descompassada, desafinada. E feliz.
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PS: Aviso aos navegantes: Talvez, as redes sociais sejam o álibi perfeito para a hipocrisia. A fantasia perfeita para as relações. A absolvição àqueles incapazes de olhar nos olhos, incapazes de lidar com as verdades (suas e alheias). Eu... não acredito que um scrap substitua um abraço. Não suporto ser marcada em fotos por amigos que não me veem há anos. Não mando recados maquiados em nicks. Não consigo “curtir” nada num click. Nem meço o meu coração (e o dos outros) num “emotion”.

Ah... me mandem cartas. Venham fazer parte da minha vida. Venham me mostrar algo que mereça a minha atenção. E emoção.

PS2: Ah, tenho me divertido (e me emocionado) com a literatura do Fábio Roberto. Eu, que já era sua fã, agora tenho o privilégio de mordiscar quase que diariamente suas loucuras:

"Uma mulher é realmente importante para você quando não te faz falta. Faz pênalti."

Fá, genial!!! http://faroberto.blogspot.com/