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domingo, 9 de junho de 2013

Muralha

Para ela, amor era bicho estranho. Bicho que não podia entrar em casa e precisava caber no seu quintal.

Por vezes, experimentara dias sem abrir a porta, testando o apreço e a força do animal. Quando ele quase esquecia seu rosto e seu calor, aparecia sorrindo, com água, comida e um abraço. Fraco, fazia festa. Feliz, fazia amor.

Mas ela corria de súbito. Voltava à segurança dos azulejos que escolhera para enfeitar a rigidez das paredes da casa. Fechava a janela e o coração. Espiava escondida contando os segundos que dignificavam o sacrifício, a planejada negligência e ele ainda ali. Era mesmo amor?

Bicho estranho, louco, estupidamente forte. Quanto tempo resistiria? Quanto sobreviveria cercado no quintal da moça, vivendo de pão e expectativas?

Precisava de carne. Quase leão, quase louco, queria era mordê-la logo, abrir os portões e roubá-la pra si.

Que afinal, não era bicho de quintal. Era selvagem, cheio de músculos, cicatrizes e sorrisos. Caçava bem. Vivia bem. Mas, desde que a vira, decidiu que não precisava de tanto. Precisava dela.

Ela, temerosa. Que além dos portões, o perigo do imprevisível. Podia ser frio, podia chover, podia ser “não”. Não deixava o amor entrar em casa, mas também não o deixava partir.

Paciente, como os bichos que entendem de alma e desejo, o amor via o dia passar. À noite pensava em invadir a casa, surpreendê-la descalça, abrir-lhe as janelas e o sutiã.

Contido, não queria assustá-la. Queria inteira e lúcida aquela moça, linda de tanto receio, de tantas trancas e botões.

Concentrava-se em não desistir. Que o caminho mais fácil era pular logo aquele muro e correr, até que a lembrança dela perdesse a cor.
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PS esclarecedor: Eram duas laranjas: uma amava e a outra...

Também.

Leandro Henrique, adorei e adotei o conceito das laranjas já que elas estão em todo o lugar... rsrsrsrs.

PS dos protagonistas: Ninguém vai dizer o que fazer, nem porquê, nem quando. Se uma casa com quintal é pouco, talvez vocês precisem de um espaço maior. Aqui fora, esperamos ansiosamente. Venham respirar...

Um comentário:

Anônimo disse...

Perfeito... Como sempre!