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sexta-feira, 22 de maio de 2009

Vestígios

Há dez anos você me surpreendeu com uma poesia dessas de final de tarde. Dessas, de quem ama todo dia mais. De quem espera no portão alguém que já é seu. E emociona, anoitece e amanhece - e acorda com a felicidade na boca. O título era “Vestígios”, que agora eu empresto pra contar de nós.

E era tudo o que eu amava em você. Aquele sorriso torto, aquela força delicada. Aquele desejo que, com o tempo, era quase devoção.
A paciência incrível ao me assistir, ao me esperar. A pressa em experimentar todos os dias a mulher que você ajudou a construir.

E não importava onde eu estava, se me atrasava ou se chegava com um buquê de confusões. Você me tomava nos braços e me amava. Com fome, com fé, com perdão.

Eu abusava dos teus carinhos, dos teus cuidados, do teu braço forte e do teu coração. Mas era toda sua em minhas meninices. E a minha força ingênua te salvava do mundo e de si mesmo. Um dia você me olhou e percebeu que algo havia mudado. Passou dias intrigado e não conseguia entender. Até que disse, já com a naturalidade e a ternura de um pai: você está grávida.

Eu ri e respondi que você estava ficando louco. Que era quase impossível. E que, mesmo que fosse verdade, você não saberia assim, por pura intuição. Disse que meu jeito estava diferente e que o meu corpo também. Eu ri mais um pouco e você insistiu. Me fez prometer que iria marcar uma consulta.

Prometi, mas não tinha motivos pra me preocupar. Só marquei a consulta depois que você me cobrou mais umas três vezes.

E uma semana depois, estava lá. Trêmula. Com o resultado nas mãos e uma esperança no ventre. Chorava de medo, de deslumbre, de amor. De um amor que eu nunca vou conseguir explicar. E nunca entendi como é que você havia percebido e eu, não.

Eu tinha 18 e você 23. Foi há tanto tempo. Como diria minha sobrinha, “foi depois de ontem”. Beeem depois de ontem.

Eu sabia que estaria ao meu lado e que seria um pai incrível. Mas a verdade é que eu achei que podia enfrentar o mundo - todas as reações contrárias, as surpresas e as reprovações.

E uma das reprovações não estava nos nossos planos. Alguém apareceu, como se fosse a própria maldição. Como se fosse um demônio no meu jardim de anjos. E suas palavras tinham o poder da maldade, do desamor, do desengano. Abriu-se uma ferida em mim. E sangrou tanto. Sangrou até o nosso sonho morrer, numa madrugada de dor desumana.

Ah, eu nunca mais seria a mesma. Sempre faltaria um pedaço, uma luz, uma esperança. Depois disso, você queria casar e eu só queria esquecer.

Fui me afastando de você até não poder voltar. Até ter notícias raras – e rasas sobre a tua vida. Até te encontrar, anos depois, fria. E recusar, pela segunda vez, o teu mais lindo pedido de casamento.

Meu amor, me perdoe. Me perdoe por não ter sido a tua mulher. Me perdoe por ter perdido o nosso filho e por ter despeçado a minha alma, que era sua também.

Me perdoe por não poder te tocar. Por não entender o que você diz e o que você quer. Me perdoe por eu ter investido tantos anos em técnicas pra esquecer o que sou. Entenda, ninguém vai tomar o seu lugar. Nem o meu.

Não somos o resto de uma história. Não somos sobreviventes.

Você foi o homem mais incrível que eu amei. E obrigada por também ter me amado tanto.

Fique em paz, que eu prometo me cuidar. Que eu... vou ficar bem.
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PS1: Lelê, o que dizer p/ vc? Vc, que me socorre, que escuta meu coração e me mostra o seu, que me lembra que tem coisas que só eu posso fazer. Ah, Lelê... se eu estou na trilha sonora da sua vida, vc está na minha vida inteira. Amo você, cabecinha-gorda-da-estrela-versão japa... rsrsrsrsrs

PS2: A Lelê é minha amiga-irmã. Mas eu também tenho o privilégio de ter uma irmã-amiga. Tia Rosi, você é uma mulher incrível. Mas p/ abraçar o mundo sem se machucar (tanto), é preciso manter a calma. O problema é que p/ “manter”, é preciso ter alguma... (isso vale p/ nós duas... rsrsrs). Também amo você. E sei que, assim como a Lelê, já fazia tempo que vc esperava eu colocar p/ fora os “vestígios” do texto de hoje...

PS3: Ufa!

PS4: Totyyyyyyy... guardei a garrafa de whisky p/ dividir com vc. Naquele dia, antes mesmo do seu comentário, quase te liguei. Senti falta das conversas que ainda nem tivemos.

5 comentários:

Unknown disse...

Imagino o quanto doído foi destilar essas emoções, porém, chega um momento na vida que é preciso expurgar, na tentativa, vã, de encerrar ciclos...
É isso aí, Alê, destile tudo, só assim a poetisa consegue viver!
Bjs,

TOTYNIX disse...

Emocionada Alê! Uma vez me disseram, que as pessoas mais iluminadas, são testadas constantemente. Normalmente essas lindas pessoas, tem histórias tristes demais. Momentos difíceis demais. Isso talvez explique esse capítulo de sua vida. Feliz por você ter conseguido eternizar esse momento de forma tão comovente e bela. E pelo momento de fazê-lo, ter chegado. Daqui, minha admiração e carinho declarados. Já dividimos nossas histórias e palavras, ansiosa pelo momento de dividirmos nossa garrafa de whisky. Cada vez maiiiiiiiiiiiiiiiiiis ansiosa por nosso encontro...beijooooooooooooooo!!!

Anônimo disse...

Lelê...tô sem palavras...vc tbm tá na minha vida inteira...na trilha sonora...e na produção completa...mto obrigada, por me escutar...em todas as horas...te amo d+ cabecinha...e não preciso nem dizer que sempre estarei aqui...a qualquer hora...até de madrugada se vc precisar...amei o seu desabafo...sua conversa...perfeito...já imaginava q seria assim mesmo que vc descreveria e com certeza...ele vai ler...ou até já leu enquanto vc escrevia...vai entender...vai te responder...mas com certeza vai continuar te amando...pq foi tudo mto inesquecível...bjos - Ps. Chorei...

TOTYNIX disse...

Toda hora entro aqui e fico emocionada. Esse texto me acertou em cheio...No coração e na alma...bjo linda!!!!

Meire disse...

Cara... Isso foi d+!!!

Consegui visualizar vcs dois neste texto o tempo todo. Relembrei momentos, chorei de tristeza e emoção! Tenho certeza q depois disso o q resta é amor... e vc sabe que o amor liberta, e talvez agora vc esteja sentindo o amor q ele sente por vc de verdade, viva feliz!!!

Amo vc!!



Bj.

Meire