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domingo, 21 de março de 2010

Chica da Silva

Sou negra, cafuza, brasileira. Intrinsecamente, absolutamente negra. E 122 anos depois da Lei Áurea, pergunto: o que é que se aboliu naquele treze de maio, se o preconceito e as privações sociais continuam assombrando os nossos dias?

Se a princesa Izabel tivesse poderes sobrenaturais, ainda assim não teria conseguido devolver aos homens o seu direto de SER. E ficou conhecida como “A redentora”. Mal sabia que a redenção, de fato, nunca viria. Nunca. Talvez em outro planeta. Em outro milênio. Em outra sociedade. Porque na minha, o que se vê (e o que muitas vezes se esconde) é a perpetuação das distinções.

O tronco, os navios negreiros, os quilombos... apenas mudaram de tempo e de lugar. A escravidão se modernizou. Ganhou requintes e legalidade. E num país de caboclos, cafuzos, mulatos e mamelucos, os negros e os índios ainda são negligenciados. Ainda são velados – como mortos-vivos. Ainda estão à margem de tudo o que se considera ideal e cívico.

Mas é claro, devo admitir. Houve um progresso. Hoje eu consigo comprar uma meia-calça cor da pele que tem realmente a cor da minha pele. E isso vale pra maquiagem, desodorante, cremes, xampus, roupas e até baladas que foram feitas sob medida para a minha negritude. Peraí. Não é evolução, nem redenção. É marketing. É toda uma indústria preocupada em aproveitar o potencial de consumo de um nicho que significa mais de 50% da população brasileira.

Calma. Vou tentar de novo. Temos Obama – presidente do planeta. Temos Thaís Araújo protagonizando a novela das oito num canal que dita as regras no país. Hummm... a coisa está mudando? Não. No aniversário de Yemanjá, em fevereiro, todos os jornais, homenagens e notícias mostravam a imagem de uma branca. E eu pergunto: cadê a Yemanjá africana, negra, original? Quando é que vamos admitir e corrigir o sincretismo que obrigou os escravos a associar seus orixás aos santos da igreja católica – se quisessem continuar com a sua fé, tinham que disfarçá-la. E foi assim que Yemanjá embranqueceu. Foi assim que minha Iansã virou Santa Bárbara, Ogum virou São Jorge e Michael Jackson virou o caso mais bizarro que eu conheço de negação à afrodescendência.

Michael e Yemanjá, brancos e populares. Mas, todo mundo diz que não. Não tenho preconceito, não tenho piedade, sou da paz. A neutralidade me enoja. Uma vez me apaixonei por um cara que tentava amenizar a diferença ouvindo Racionais e Bezerra da Silva. Desfilava comigo por aí, como se dissesse “tá vendo: sou bem resolvido e valorizo a miscigenação”. Até que um dia me disse, na cara: “Não sei. Enquanto éramos amigos, tudo bem. Mas nunca pensei que me apaixonaria assim, por alguém mais escuro que eu”. Terminei e agradeci aquela sinceridade. Fiquei feliz em saber que é preciso muita coragem pra falar ESSA verdade. Agradeço até hoje. E temo quantos quiseram dizer, mas preferiram justificar de outra forma a covardia.

E até hoje, me incomoda quando me chamam de “morena”. É como se quisessem me sincretizar. É como se quisessem “amenizar” a minha identidade. Daqui a pouco, me colocam numa prateleira – morena clara do cabelo liso, ao lado de Yemanjá. E eu tô mais pra Chica da Silva.

Ah, sou neguinha. Das piores. Das misturadas com índio. Das marcadas pela omissão da história. Das que têm preto veio e maracá... Dona Cafuza.
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PS: 21 de Março - DIA MUNDIAL CONTRA A DISCRIMINAÇÃO RACIAL
Massacre de Sharpeville
(http://pt.wikipedia.org/wiki/Massacre_de_Sharpeville)

No dia 21 de Março de 1960, ocorreu na cidade de Sharpeville, na província de Gauteng, na África do Sul, um protesto, realizado pelo Congresso Pan-Africano (PAC). O protesto pregava contra a Lei do Passe, que obrigava os negros da África do Sul a usarem uma caderneta onde estava escrito onde eles podiam ir.

Cerca de cinco mil manifestantes reuniram-se em Sharpeville, uma cidade negra nos arredores de Johannesburg, e marcharam calmamente, num protesto pacífico. A polícia sul-africana conteve o protesto com rajadas de metralhadora. Morreram 69 pessoas, e cerca de 180 ficaram feridas.

Após esse dia, a opinião pública mundial focou sua atenção pela primeira vez na questão do apartheid. No dia 21 de Novembro de 1969, a ONU implementou o Dia Internacional Contra a Discriminação Racial, que passou a ser comemorado todo dia 21 de Março, a partir do ano seguinte.

3 comentários:

Cåm¡£¡ñhå disse...

Incrivél Ale esse post!
Quer seguir carreira de escritora? rsrsrs

Dispensa comentários neguinha.

Beijo grande!

Anônimo disse...

Oh neginha, Vixe Maria.......
É neguinha, a coisa ta preta.
Mas também, a coisa jamais seria “morena, moreninha clara ou quem sabe, até talvez “LOURÃO”
Já pensou!
A coisa ta “LOURÃO”???
As coisas por aqui são sempre assim.
Na França:
THIERRY HENRY
No Brasil:
Manuel Francisco dos Santos, vulgo “MANÉ GARRINCHA”
Mané já é meio ofensivo “Malandro é Malando e Mané é Mané” e Garrincha, de onde tiraram isso???
Na Alemanha:
Franz Anton BECKENBAUER
No Brasil:
Edson Arantes do Nascimento, vulgo “PELÉ”
Pelé, o que é Pelé????
E por aí vai.
Felizmente temos grandes nomes da raça “negra” ou deveria dizer “afro descendente” para ser politicamente correto, que não tem medo e nem se envergonham da cor que trazem na pele, para encantar os quatro cantos do mundo com suas obras, canções, poesias, esportes, etc, etc.
Ainda estamos nos tempos das “diligências”, entretanto até já conseguimos eleger um Presidente semi analfabeto, considerado por muitos, um dos melhores estadistas mundiais, menos e é claro, para os costumeiros tecnocratas, “burrocratas” de plantão.
Não se irrite, não se irrite, as coisas estão andando, a passos de tartaruga, mais ainda chegamos lá.
Quem sabe, a ponto de dizer:
A coisa ta “LOURÃO”
Quanto a Ogum ter virado São Jorge, não se importe, o que vale é o guerreiro que existe dentro de nós.

Eu andarei vestido e armado com as armas de São Jorge para que meus inimigos, tendo pés não me alcancem,
tendo mãos não me peguem,
tendo olhos não me vejam,
e nem em pensamentos eles possam me fazer mal.
Armas de fogo o meu corpo não alcançarão,
facas e lanças se quebrem sem o meu corpo tocar,
cordas e correntes se arrebentem sem o meu corpo amarrar.
Pois eu estou vestido com as armas de Jorge,
Jorge é da Capadocia.
Salve Jorge.

Continue sendo neguinha, DAS PIORES, continue sendo Dona Cafuza, afinal você também é “GÊNIA”.

Em tempo:
Fiquei sabendo que talvez você leve minha priminha mais doce, meiga, compreensiva, educada e obediente, digo “Heleninha”, para um almoço em um restaurante com musica ao vivo???
E que caso isso aconteça, o “canto”, QUEM É O “CANTÔ”??, ou será “poeta, poetinha, camarada”, irá dedicar uma parte de seu cancioneiro especialmente a ela???
E eu tenho que participar deste almoço????
QUE BOM!
Ok, topo, porque não??? Vamo cai pra dentro.

Bjos. Salve Jorge do melhor Jorge!!!

Apampa disse...

Maninha... Tamu junto.. Passou das 18:00hs é noite, não tem esta de meio termo. Moreno, pardo.. (rsrs).. Mesmo assim graças a Deus temos orgulho desta corzinha escurinha linda que temos.

Viva Zumbi.